Saiba como identificar rapidamente uma Hemorragia Subaracnóidea 

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A hemorragia subaracnóidea (HSA) é uma emergência neurológica grave, com alta taxa de mortalidade, que atinge aproximadamente 50% dos casos. Saber identificar qual o tipo de hemorragia está ocorrendo com o paciente é fundamental para iniciar um correto tratamento de forma rápida.

Por que saber diferenciar os tipos de hemorragia?  

A hemorragia subaracnóidea representa de 2% a 7% de todos os acidentes vasculares cerebrais (AVCs). O público mais afetado são mulheres entre 49 e 55 anos. A causa mais comum de HSA não traumática é a ruptura de um aneurisma sacular. Aneurismas maiores que 7mm e os localizados na circulação posterior apresentam maior risco de ruptura.

Ilustração do polígono de Willis mostrando a vascularização cerebral com locais mais frequentes de aneurismas: artéria comunicante anterior (40%), artéria cerebral média (34%), artéria comunicante posterior (20%) e ponta da artéria basilar (8%).
Vascularização cerebral com frequência de aneurismas encontrados. | Acervo de Aulas do Grupo MedCof.

Os aneurismas saculares mais frequentes são encontrados no complexo da artéria comunicante anterior (40%) e na junção da artéria comunicante posterior com a artéria carótida interna (30%).

Como se comporta o quadro clínico?

A manifestação mais característica da HSA é a cefaleia em trovoada (ou thunderclap headache), uma dor de cabeça de início súbito que atinge sua intensidade máxima em menos de um minuto e é descrita pelo paciente como a pior dor de cabeça da vida.

Outros sinais e sintomas importantes incluem:

  • Cefaleia “sentinela“: Uma dor de cabeça de menor intensidade que pode ocorrer alguns dias ou semanas antes da ruptura do aneurisma.
  • Rebaixamento do nível de consciência.
  • Sinais meníngeos: Como rigidez nucal, além de sinais de Kernig e Brudzinski. (Relembre aqui os sinais meníngeos!). 

A cefaleia pode ser desencadeada por esforço físico ou sexual. Além disso, vale destacar que a hipertensão intracraniana é um sintoma importante, pois pode evoluir para coma.

A Escala de Hunt-Hess é utilizada para classificar a gravidade do quadro clínico.

Fonte: https://share.google/images/Nblli0uDtCKxrDeCP

Como é feito o diagnóstico? 

O exame de escolha na emergência para diagnóstico de HSA é a tomografia de crânio sem contraste. Sua sensibilidade é de quase 100% nas primeiras seis horas após o início dos sintomas. Quanto mais precoce a realização, maiores as chances de detectar o sangramento. No entanto, uma TC de crânio normal não exclui o diagnóstico se o quadro clínico for típico.

Se houver forte suspeita clínica e a TC de crânio for normal, o próximo passo é a punção lombar para análise do líquor. A presença de líquor xantocrômico e hemácias degeneradas é altamente sugestiva de HSA.

Tipo de amostra de LCR em tubos estéreis. A.Límpido; B.Xancrômico; C.Hemorrágico.
Fonte: INML https://share.google/8yQyiEx9p36wauGLO 

Para identificar a causa e a localização do aneurisma, exames como a angiotomografia, angiorressonância ou a angiografia digital podem ser utilizados. A angiografia digital é considerada o padrão-ouro, pois além de diagnóstica, permite a abordagem terapêutica.

A Escala de Fisher é usada para classificar a hemorragia na TC, o que ajuda a prever o risco de complicações como vasoespasmo e isquemia cerebral.

Tabela da escala de Fisher para hemorragia subaracnóidea, classificando de grau 1 a 4: grau 1 sem hemorragia; grau 2 com sangramento difuso menor que 1 mm; grau 3 com sangramento maior que 1 mm; grau 4 com hemoventrículo ou hemorragia intraparenquimatosa com ou sem HSA.
Descrição da escala de Fisher. | Acervo de Aulas do Grupo MedCof.

Qual o melhor tratamento? 

O principal objetivo do tratamento é “fechar” o aneurisma o mais rápido possível para prevenir o ressangramento. As duas abordagens terapêuticas, ambas igualmente eficazes, são o tratamento endovascular (embolização) e o tratamento cirúrgico (clipagem).

Em relação à meta pressórica, a diretriz de 2023 não definiu um valor exato, mas sugere que uma pressão arterial sistólica (PAS) em torno de 160 mmHg é tolerável até que o aneurisma seja clipado. Não se indica o uso rotineiro e profilático de ácido tranexâmico ou drogas para crises epilépticas.

E existem possíveis complicações?

As principais complicações da HSA são:

  • Ressangramento: Ocorre principalmente nas primeiras 72 horas e é a principal causa de mortalidade. O fator de risco mais importante é a pressão arterial elevada. O controle da pressão arterial e o tratamento precoce do aneurisma são essenciais para evitar essa complicação.
  • Vasoespasmo e Isquemia Cerebral Tardia (ICT): O vasoespasmo é a constrição dos vasos sanguíneos cerebrais devido à irritação causada pelo sangue. Ele ocorre, geralmente, do 3º ao 14º dia, com pico no 7º dia. A ICT é uma complicação do vasoespasmo. A profilaxia é feita com Nimodipino 60mg 4/4h por 21 dias, que ajuda a reduzir a ICT.
  • Hidrocefalia: É a complicação neurológica aguda mais comum, presente em até 50% dos casos. Pode causar rebaixamento do nível de consciência e geralmente ocorre até o 7º dia. O tratamento é realizado com derivação ventricular externa (DVE) ou DVP.
  • Crises epilépticas: A profilaxia é considerada apenas para pacientes de alto risco. O uso de fenitoína é desaconselhado, pois aumenta o risco de vasoespasmo e piora os desfechos cognitivos.
  • Hiponatremia: Ocorre em 30% a 50% dos pacientes. Os mecanismos incluem a síndrome perdedora de sal e a síndrome da secreção inapropriada de hormônio antidiurético (SIADH).
  • Complicações sistêmicas: A hiperatividade simpática pode levar a problemas cardiopulmonares como infarto agudo do miocárdio, arritmias e edema pulmonar. A febre de origem central é uma complicação comum associada a um pior desfecho clínico.

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Questões de acesso direto R1

[USP-RP, R1 acesso direito, 2022]
Homem de 50 anos, previamente hígido, com quadro de cefaleia súbita associada a vômitos e perda da consciência transitória durante realização de atividade física. Acompanhante relata não ter havido traumatismo craniano. Deu entrada no Pronto Atendimento conscientee lúcido, sem déficits sensitivo-motores, com rigidez de nuca e presença do sinal de Brudzinski. Seu exame de tomografia computadorizada inicial sem contraste encontra-se em anexo.

Fonte: prova de R1 acesso direito, USP-RP, 2022

Qual a etiologia mais provável?
A) Ruptura de malformação artério-venosa intracraniana.
B) Hipertensão arterial (pico hipertensivo).
C) Ruptura de aneurisma intracraniano.
D) Vasculite do sistema nervoso central.

Resposta correta:
C) Ruptura de aneurisma intracraniano.
Quando pensamos em um quadro súbito de cefaléia intensa associado a uma HSA, nossa
primeira hipótese deve ser ruptura de aneurisma.

Comentário da questão feito por especialista

Vamos lá, pessoal! Questão sobre hemorragia intracraniana que cobrou conceitos simples,
então não podemos deixar de acertar. Temos na questão um paciente de 50 anos
previamente hígido que durante a atividade física (momento de valsalva e aumento da
pressão intracraniana) apresentou um episódio de cefaleia súbita, vômitos e perda de
consciência, acompanhados de sinais de meningismo. Por fim, ele nos mostra esta tomografia. Ora, a banca nos deu todos os sinais possíveis de que o paciente apresentou uma Hemorragia Subaracnoidea (HSA), mas nos pergunta qual a provável etiologia.

O primeiro passo para compreendermos a diversidade dos sangramentos intracranianos é
entender bem onde está sangrando. Afinal, temos sangramentos intraparenquimatosos,
epidurais, subdurais, entre outros. Como o próprio nome diz, o sangramento na HSA é no
espaço subaracnoideo (entre a aracnoide e a pia-máter), espaço repleto de líquido que aloja vasos cerebrais.

A HSA pode ter diversas etiologias, sendo a não traumática mais comum (cerca de 80%), a ruptura de aneurismas cerebrais. Assim, outras etiologias possíveis são trauma, malformação arteriovenosa, coagulopatia, trombose venosa cerebral, entre outras.
Caracteristicamente, a HSA por ruptura de aneurisma é acompanhada da “thunderclap
headache
”, tida como uma cefaleia súbita, qualificada pelo paciente como a pior da vida.
Outros sinais que acompanham são de meningismo (irritação das meninges pelo sangue):
rigidez de nuca, Brudzinski, Lasègue; e de hipertensão intracraniana (aumento do volume
intracraniano): déficits focais, vômitos, fotofobia, perda de consciência. Muitas vezes, os
pacientes apresentam cefaleias sentinelas, antecedendo a ruptura em 1 a 2 semanas.

Dessa forma, uma vez levantada a suspeita, idealmente devemos lançar mão de uma angiotomografia, buscando identificar a etiologia e o local de sangramento. Em caso de dúvida diagnóstica apesar da angiotomografia ou exame indisponível, podemos realizar a punção lombar, para avaliar o aspecto do líquor

E assim, ao analisarmos as tomografias sem contraste, devemos nos lembrar que o sangramento agudo é hiperdenso. Logo, como na imagem da questão, o que vemos é um hipersinal que ocupa espaços que seriam ocupados pelo líquor, como nas cisternas basais,
perimesencéfalo (formando o sinal do “coração” ou do “Mickey”), fissuras sylvianas e nos
giros.

O tratamento consiste inicialmente em medidas para hipertensão intracraniana (cabeceira
elevada, normotermia, euglicemia, saturação > 93%, etc) associada a medidas direcionadas para as complicações do sangramento.

Devemos assim que diagnosticado iniciar o nimodipino, um bloqueador do canal de cálcio
que inicialmente acreditava que se evitava o vasoespasmo, complicação grave que pode
ocorrer em até 3 a 5 dias do ictus. Apesar de não haver estudos convincentes nesse
sentido, ele ainda demonstrou melhora no desfecho, por isso indicado. Por fim, há ainda o
tratamento direcionado para o aneurisma, que pode ser abordado de via aberta ou
endovascular.

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