
As espondiloartrites representam um grupo complexo de doenças inflamatórias que, embora distintas, compartilham características clínicas e patológicas.
Quais os principais tipos de Espondiloartrites?
As espondiloartrites são um “guarda-chuva” na medicina, englobando um grupo de doenças inflamatórias com manifestações clínicas em comum. Elas podem ter predomínio axial, afetando principalmente a coluna vertebral, como na espondilite anquilosante, ou predomínio periférico, com impacto nas articulações e ênteses, como na artrite psoriásica, artrite relacionada a doenças inflamatórias intestinais (DIIs), artrite reativa e artrite indiferenciada.
Axiais | Periféricas |
Espondiloartrite axial não radiográfica | Artrite Psoriásica (associada à psoríase cutânea) |
Espondiloartrite Anquilosante | Artrite Reativa |
Artrite das DIIs | |
Indiferenciada |
Manifestações da Espondiloartrite
As manifestações comuns incluem entesite, dactilite, oligoartrite periférica assimétrica, acometimento axial com inflamação (sacroiliíte), psoríase, doença inflamatória intestinal e uveíte. Além disso, a inflamação axial pode se manifestar como espondilite e sacroiliíte.
A dactilite é caracterizada por hiperemia e aumento do volume do dedo em sua extensão, assemelhando-se a um “dedo em salsicha”.

Entesite é a inflamação do aparelho ou tendão que se insere em uma estrutura óssea (êntese).

As manifestações extra-articulares abrangem Doença Inflamatória Intestinal (DII), psoríase e uveíte.
Quais os principais sintomas das Espondiloartrites?
Os sintomas variam de acordo com o tipo predominante de espondiloartrite:
Espondilite Anquilosante
É uma artrite inflamatória do esqueleto axial (coluna e quadris, principalmente na coluna). O sintoma mais comum é a lombalgia, que segue um padrão inflamatório: evolução por mais de 3 meses, início com menos de 40 anos, rigidez matinal prolongada, piora com o repouso, melhora com o movimento e acorda o paciente à noite.
A artrite é de padrão oligoarticular, afetando grandes articulações e sendo assimétrica. Os sítios mais acometidos por entesite são a fáscia plantar e o tendão do calcâneo. Queixas extra-axiais incluem uveíte anterior (20-30% dos casos), que se manifesta com dor ocular, eritema e fotofobia, sendo o acometimento extra-articular mais comum, com padrão recorrente e unilateral.
Outras manifestações incluem psoríase (10%), insuficiência aórtica (2-6%) e fibrose dos ápices pulmonares (rara). No exame físico, pode-se observar acentuação da cifose torácica e limitação da flexão e extensão da coluna, levando à incapacidade de se abaixar.
O Teste de Schober avalia a mobilidade da coluna lombar: marca-se a espinha ilíaca póstero-superior e outra linha 10 cm acima; pede-se ao paciente para realizar uma flexão máxima forçada com os joelhos próximos. Normal se o aumento entre as duas marcas for > 5 cm ou a distância total de 15 cm; alterado se a variação for < 5 cm, sugerindo acometimento da coluna lombar.
A Avaliação da Caixa Torácica é feita medindo o perímetro torácico no 4º espaço intercostal em expiração máxima e inspiração máxima; a variação normal é > 5 cm, indefinida entre 2,5-5 cm e anormal se < 2,5 cm, denotando limitação da expansibilidade torácica.
O Teste de Faber avalia a articulação sacroilíaca e é positivo quando há dor na articulação contralateral após flexão, abdução e rotação externa.
Artrite Psoriásica
É a principal espondiloartrite periférica, mais comum entre 20-45 anos, sem predomínio entre os sexos. O acometimento cutâneo precede as queixas articulares em 75% dos casos, mas cerca de 15% dos pacientes apresentam manifestações articulares sem acometimento da pele. As lesões dermatológicas características são eritemato-descamativas em cotovelos, joelhos, couro cabeludo, nádegas, umbigo e região posterior da orelha.
Existem cinco apresentações clínicas:
- Oligoarticular assimétrica com dactilite (70%): a mais comum, tende a ocorrer em grandes articulações, especialmente os joelhos. A dactilite é caracterizada por entesite localizada, edema de tecido subcutâneo e paratendinite.
- Poliarticular, simétrica, que acomete interfalangeana distal (25%).
- Distal exclusiva de interfalangeana distal, com componente ungueal em “pitting” (3ª mais comum).
- Mutilante/”mutilans”: em 5% dos casos, gera grande debilidade, com “dedos em telescópio”.
- Espondilite (5%): associada ao HLA-B27.
- A radiografia pode mostrar erosões assimétricas, neoformação óssea, “pencil-in-cup” (erosão em lápis-em-copo) e neoformação óssea lateral com erosão da falange média.
Artrite Enteropática
Quadro de espondiloartrite (axial ou periférica) associado à doença inflamatória intestinal (DII). Cerca de 50% dos pacientes com DII possuem algum sintoma extra-intestinal, sendo artrite e artralgia as queixas mais frequentes. A artrite periférica é mais associada à Retocolite Ulcerativa (RCU), é não erosiva, oligoarticular, assimétrica, afeta mais os membros inferiores e demonstra relação com a atividade da doença. A sacroileíte é mais associada à Doença de Crohn (DC), pode preceder o quadro gastrointestinal e não tem relação com a atividade da doença.
Artrite Reativa
Oligoartrite periférica, assimétrica, que ocorre após infecções urogenitais e intestinais. O HLA-B27 está presente em 60% dos pacientes (menos que na Espondilite Anquilosante). É típica de indivíduos de 18-40 anos, com prevalência igual entre homens e mulheres. Os germes mais implicados são Chlamydia trachomatis (50%), Campylobacter jejuni, Shigella flexneri e sonei, Yersinia enterocolitica e pseudotuberculosis. Os sintomas iniciam-se 1-4 semanas após a infecção. O acometimento articular é oligoarticular assimétrico, podendo estar associado a dactilite e entesite, afetando, em boa parte dos casos, o joelho.
Outras manifestações incluem balanite (acometimento inflamatório, asséptico da glande), ceratoderma e conjuntivite.
A Síndrome de Reiter, caracterizada pela tríade artrite + uretrite + conjuntivite, é considerada parte da apresentação clínica da artrite reativa.
Como descrever a fisiopatologia dessas condições?
A fisiopatologia das espondiloartrites envolve uma complexa interação entre fatores genéticos, imunológicos e ambientais. A associação com o HLA-B27 é um dos marcadores genéticos mais importantes, presente em 88% dos casos de espondilite anquilosante. Embora o HLA-B27 seja positivo em 9% da população, apenas 2-6% dos indivíduos positivos desenvolvem espondilite anquilosante. Isso indica um baixo valor preditivo positivo (VPP), mas um alto valor preditivo negativo (VPN). Ou seja, se o paciente tem HLA-B27 positivo, mas é assintomático e sem achados de imagem característicos, o resultado não é significativo. No entanto, se o paciente tem o quadro clínico, mas é HLA-B27 negativo, a probabilidade de ser espondilite anquilosante diminui muito.
A inflamação crônica é uma característica central, manifestando-se como entesite (inflamação das ênteses), sinovite (inflamação da membrana sinovial das articulações) e sacroiliíte (inflamação das articulações sacroilíacas).
Os reagentes de fase aguda, como PCR e VHS, podem estar aumentados em casos mais graves. O processo inflamatório pode levar à formação de novo osso, como os sindesmófitos (calcificação do ligamento longitudinal anterior), que, em estágios avançados, podem resultar na “coluna em bambu“, com quadratura e retificação dos corpos vertebrais. Outra lesão característica é a Lesão de Romanus (pontos brilhantes no extremo dos corpos vertebrais), causada por inflamação em ênteses, que leva à erosão da porção superior da vértebra. Exames de imagem são cruciais para o diagnóstico e acompanhamento:
- Radiografia de sacroilíacas: Pode mostrar esclerose, limites indefinidos, erosões e anquilose (sacro e ilíaco “fundem-se”).
- Tomografia Computadorizada: Evidencia esclerose bilateral, erosão, limites mal definidos e redução do espaço articular.
- Ressonância Magnética (RM): É útil para diferenciar sequelas de atividade da doença. As sequências STIR mostram focos de edema ósseo e inflamação (atividade da doença, com imagem branca indicando líquido/inflamação). As sequências T1 (gordura mais branca) podem analisar pontos brancos que representam degeneração gordurosa, significando atividade prévia (sequelas/quadros não ativos).
Prevalência das Espondiloartrites no Brasil
Embora ainda esteja sob pesquisa no Brasil, a espondilite anquilosante, um tipo de espondiloartrite, afeta cerca de 1% da população geral. Globalmente, a prevalência das espondiloartrites é significativa, e a doença pode ser subdiagnosticada em algumas regiões.
Como tratar a Espondiloartrite?
O tratamento das espondiloartrites evoluiu consideravelmente e visa controlar a inflamação, aliviar os sintomas e prevenir a progressão da doença.
Anti-inflamatórios Não Esteroides (AINES)
São a primeira linha de tratamento. O uso contínuo tem mostrado maior benefício, incluindo a redução da progressão radiográfica. Preferem-se os mais seletivos para COX-2, e o uso é sugerido por, pelo menos, 4 semanas. Na artrite enteropática, deve-se ter cuidado devido ao risco de reativação da Doença Inflamatória Intestinal. Na artrite reativa, são uma boa opção para o quadro articular.
Agentes Biológicos (bDMARDs)
Representam um avanço significativo para casos de falha ao uso de AINES ou em casos mais graves.
Anti-TNFs (grupo dos 5)
Infliximabe, Etanercept, Adalimumabe, Golimumabe e Certolizumabe. São utilizados para evitar a evolução da doença. As contraindicações incluem tuberculose ativa (contraindicação absoluta), neoplasia e insuficiência cardíaca. O Certolizumabe pode ser utilizado na gravidez. Para a artrite enteropática, Anti-TNFs (exceto Etanercept) apresentam efeito na doença inflamatória intestinal e no quadro articular. Na artrite reativa, são indicados para quadros refratários, embora com baixa evidência.
Existem ainda algumas mais específicas para cada caso, como Anti-IL- 17 e alguns antibióticos.
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