
O trauma abdominal é uma ocorrência comum e uma das principais causas de morte que podem ser evitadas. O diagnóstico e tratamento precoce são cruciais para a sobrevivência do paciente. Vamos abordar sobre o trauma contuso e os principais traumas penetrantes e os tratamentos específicos para eles.
Trauma Penetrante
O trauma abdominal penetrante representa cerca de 20% dos casos de trauma abdominal e é causado principalmente por ferimentos por arma branca (FAB) ou por arma de fogo (FAF).
- Ferimentos por Arma Branca (FAB): Incluem facadas, esfaqueamentos e lesões por objetos cortantes. Eles têm uma probabilidade maior de causar lesões no fígado (40%), intestino delgado (30%), diafragma (20%) e cólon (15%). O diagnóstico é geralmente mais fácil de ser feito, e o exame físico é a principal ferramenta para a avaliação inicial.
- Ferimentos por Arma de Fogo (FAF): Podem ser causados por revólveres, espingardas, metralhadoras e bazucas. As lesões mais comuns são no intestino delgado (50%), cólon (40%), fígado (30%) e estruturas vasculares (25%).
Divisão anatômica para localizar o ferimento
A divisão anatômica do abdome auxilia na abordagem terapêutica:
- Transição Toracoabdominal (verde): Lesões nesta área podem necessitar de toracoscopia ou videolaparoscopia para investigação.
- Flanco (azul) e Dorso (laranja): Lesões nestas regiões são mais protegidas por musculatura mais espessa. A exploração local é difícil de ser realizada de forma eficaz, portanto a tomografia com triplo contraste é a principal ferramenta de investigação. O tratamento é realizado conforme as lesões encontradas.
- Abdome Anterior (cor de pele): Lesões nesta área permitem a exploração local para determinar a extensão do ferimento. O procedimento inclui antissepsia, anestesia local e a ampliação do ferimento. É crucial não “enfiar objetos às cegas” no ferimento. Se a avaliação local for negativa, pode-se realizar a sutura estéril e dar alta ao paciente. Se for positiva ou duvidosa, é preciso prosseguir com a investigação.

Quando a Cirurgia é Indicada?
A decisão de operar um paciente com trauma abdominal penetrante depende de uma avaliação criteriosa. A laparotomia é a abordagem de escolha nos seguintes casos:
- Instabilidade Hemodinâmica: Pacientes instáveis ou que não respondem à ressuscitação.
- Peritonite Clara e Persistente: Sinais de inflamação peritoneal, como dor e rigidez abdominal.
- Evisceração: Exposição de vísceras para fora da cavidade abdominal.
- Empalamento: Trauma por objeto que permanece encravado.
- Sangramento Persistente: Hemorragia que não cessa.
- Hematêmese ou Sangue Retal: Vômitos com sangue ou sangramento nas fezes.
- Ferimento Transfixante: Quando o projétil de arma de fogo atravessa completamente o corpo.

Para pacientes com trauma abdominal penetrante por arma de fogo que não apresentam indicação cirúrgica de urgência, a tomografia com contraste pode ser considerada para avaliar a trajetória e extensão da lesão. O tratamento não operatório pode ser uma opção nesses casos, com o paciente sendo monitorado de perto.
Lembre-se sempre de começar com o protocolo ABCDE e de diagnosticar e tratar o trauma abdominal relevante precocemente, pois isso tem um impacto significativo na mortalidade do paciente.

O trauma abdominal, tanto contuso quanto penetrante, pode resultar em lesões em órgãos específicos. A abordagem terapêutica, seja ela cirúrgica ou não operatória, depende do órgão afetado, do grau da lesão e da estabilidade do paciente.
Tratamento Não Operatório
O tratamento não operatório (TNO) é uma abordagem moderna para traumas específicos, mas requer condições ideais para ser seguro. Para que seja possível, o hospital deve ser um centro de referência com UTI e cirurgião disponíveis 24 horas. É essencial ter acesso a tomografia, laboratório, banco de sangue e, se possível, radiologia intervencionista. O TNO é contraindicado se houver instabilidade hemodinâmica, peritonite persistente, lesões associadas graves, ou falha do próprio tratamento não operatório. Pacientes com lesões em vísceras parenquimatosas (fígado, baço, pâncreas, rim) são os que mais se beneficiam do TNO.
Lesões em Órgãos Sólidos
Fígado
O fígado é um dos órgãos mais frequentemente lesados no trauma. As lesões são classificadas de I a VI, e a maioria é de baixo grau (I a III). O tratamento cirúrgico tem alta mortalidade e a hepatectomia é uma exceção. O TNO é possível mesmo em traumas de alto grau (até grau V).
Baço
O baço é o órgão mais lesado no trauma contuso. Diferente do fígado, há uma menor tolerância ao tratamento conservador, pois a cirurgia (esplenectomia total) é rápida e relativamente fácil. A esplenectomia parcial é uma exceção. Após uma esplenectomia, a vacinação contra germes encapsulados é necessária.
Pâncreas
O trauma pancreático é raro, geralmente associado a traumas contusos de alta energia. Lesões na cabeça do pâncreas são mais graves do que na cauda. A amilase não é um marcador confiável para diagnóstico. A avaliação do grau da lesão é feita no intraoperatório. Lesões na cauda sem lesão ductal podem ser tratadas com desbridamento e rafia, enquanto as com lesão ductal geralmente requerem pancreatectomia distal.
Lesões em Órgãos Ocos
Trato Gastrointestinal Alto
Lesões no esôfago, estômago e duodeno são raras e mais comuns no trauma penetrante. A suspeita é alta quando há pneumoperitônio ou sangue na sonda nasogástrica. Em casos de dúvida, a endoscopia digestiva alta é o melhor exame para pacientes de alto risco. Lesões pequenas no estômago (<3 cm) podem ser reparadas (rafiadas) em dois planos.
Trato Gastrointestinal Baixo
Ocorre com mais frequência em traumas penetrantes. Os sinais de alerta em traumas contusos incluem o “sinal do cinto de segurança” e a fratura de Chance.
- Cólon: Lesões pequenas podem ser tratadas com rafia. Lesões maiores podem precisar de colectomia segmentar com anastomose primária, ou colostomia em casos muito graves.
- Reto: Lesões puntiformes ou pequenas são tratadas com rafia em dois planos, drenagem local, colostomia de alça e lavagem do coto distal.
Trauma Urológico
Lesões renais são mais comuns no trauma contuso, e o tratamento conservador é a primeira opção, se possível. A bexiga, por sua vez, exige cirurgia se a lesão for intraperitoneal, mas lesões extraperitoneais podem ser tratadas com um cateter vesical (SVD).
Trauma Retroperitoneal
O retroperitônio é uma área complexa, e o trauma aqui pode causar instabilidade hemodinâmica oculta. Em pacientes estáveis, a angiotomografia é o exame de escolha para avaliação. Em traumas penetrantes, a Zona I deve ser explorada, enquanto a exploração da Zona II e III depende da estrutura lesada e se há sangramento ativo. Já no trauma contuso, a Zona I também deve ser explorada.


Trauma Contuso
O diagnóstico de trauma abdominal contuso pode ser desafiador devido à natureza muitas vezes silenciosa e insidiosa da lesão. Exames físicos detalhados são fundamentais, mas podem ser limitados pela presença de outros traumas ou pela condição clínica do paciente. A utilização de exames de imagem, como a tomografia computadorizada (TC), é recomendada principalmente em pacientes estáveis, permitindo uma avaliação mais precisa de lesões internas.

Quando realizar Intervenção Cirúrgica?
A decisão de realizar uma laparotomia em casos de trauma abdominal contuso deve ser baseada em critérios claros. Indicações absolutas incluem instabilidade hemodinâmica e peritonite persistente. Outras indicações, como pneumoperitônio ou sinais de hemorragia interna, devem ser avaliadas no contexto clínico específico de cada paciente.
Posso usar o FAST?
FAST (Focused Assessment with Sonography for Trauma) é uma ferramenta valiosa no ambiente de emergência para a rápida identificação de fluidos livres na cavidade abdominal. No entanto, é importante reconhecer suas limitações, como a possibilidade de resultados falso-negativos, especialmente em lesões de retroperitônio, quando analisamos traumas abdominais contusos.

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