Tromboembolismo Pulmonar (TEP): o que é, fatores de risco, fisiopatologia e mais!

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O Tromboembolismo Pulmonar (TEP) é definido pela impactação de um trombo (coágulo) na artéria pulmonar. Essa condição pode se apresentar tanto de forma aguda quanto crônica.

Epidemiologia

O TEP é uma das principais emergências cardiovasculares. O Tromboembolismo Venoso (TEV), que engloba o TEP e Trombose Venosa Profunda (TVP), é a terceira causa de morte cardiovascular mais comum na prática clínica, superado apenas pelo infarto do miocárdio (1º) e pelos AVEs (2º).

Principais dados epidemiológicos:

  • Incidência (anual):
    • TEP: 39-115 por 100.000 habitantes.
    • TVP: 53-162 por 100.000 habitantes.
  • Mortalidade (EUA): Aproximadamente 300.000 por ano.
  • Fator Idade: O risco é 8 vezes maior em indivíduos com mais de 80 anos.
  • Impacto Econômico: Varia em cerca de 8,5 bilhões de euros por ano na União Europeia.

Vamos conferir alguns dados de mortalidade no Brasil, retirados do DATASUS:

Período: jan/2017 – abr/2018

REGIÃOTAXA DE MORTALIDADE
Região Norte20,75
Região Nordeste26,25
Região Sudeste18,15
Região Sul14,46
Região Centro-Oeste17,77

Período: jan/2019 – abr/2022

REGIÃOTAXA DE MORTALIDADE
Região Norte23,57
Região Nordeste22,94
Região Sudeste17,88
Região Sul15,73
Região Centro-Oeste15,08

Fatores de Risco (Tríade de Virchow)

A suspeita de TEP começa pela identificação dos fatores de risco. Eles são classificados com base no Odds-ratio (OR):

Risco Alto (OR > 10)

  • Fratura de membro inferior.
  • Hospitalização por Insuficiência Cardíaca ou Fibrilação/Flutter Atrial (nos últimos 3 meses).
  • Prótese de joelho ou quadril.
  • Politrauma.
  • Infarto do miocárdio (nos últimos 3 meses).
  • Episódio prévio de TEV.
  • Lesão de medula espinhal.

Risco Moderado (OR 2-9)

  • Cirurgia de joelho (artroscopia).
  • Doenças autoimunes.
  • Transfusão de hemocomponentes.
  • Acesso venoso central.
  • Quimioterapia.
  • Insuficiência cardíaca congestiva ou respiratória.
  • Agentes estimulantes da eritropoiese.
  • Neoplasias (especialmente doenças metastáticas).
  • Terapia de reposição hormonal.
  • Terapia contraceptiva oral.
  • Pós-parto.
  • Quadros infecciosos (ex: PNM, ITU, HIV).
  • Trombofilia.

Risco Baixo (OR < 2)

  • Repouso no leito por mais de 3 dias.
  • Diabetes mellitus e Hipertensão arterial sistêmica.
  • Imobilidade (viagens prolongadas).
  • Envelhecimento.
  • Cirurgias videolaparoscópicas (ex: colecistectomia).
  • Obesidade.
  • Gravidez.
  • Veias varicosas.

 Fisiopatologia: A “Espiral da Morte”

A impactação do trombo na artéria pulmonar desencadeia uma cascata hemodinâmica grave, conhecida como a “espiral da morte” do TEP:

  1. Obstrução Vascular: O trombo causa um aumento abrupto da pós-carga do Ventrículo Direito (VD).
  2. Sobrecarga do VD: Ocorre um aumento da pré-carga do VD, levando à dilatação do VD e insuficiência da válvula tricúspide.
  3. Disfunção do VD: A tensão na parede do VD aumenta, elevando a demanda de oxigênio do miocárdio e causando isquemia de VD. Isso reduz a contratilidade e o débito do VD.
  4. Colapso do VE: Com a redução do débito do VD, há uma redução da pré-carga do Ventrículo Esquerdo (VE).
  5. Choque e Morte: A redução da pré-carga do VE leva à diminuição do débito cardíaco total, resultando em hipotensão sistêmica, choque obstrutivo e, finalmente, morte.

Diagnóstico do Tromboembolismo Pulmonar

O diagnóstico do TEP é um processo que combina suspeita clínica, estratificação de probabilidade e exames de imagem.

Quadro Clínico

Os sinais e sintomas são frequentemente inespecíficos.

  • Comuns: Dispneia, dor torácica, pré-síncope, síncope e hemoptise.
  • Raros: Instabilidade hemodinâmica, geralmente associada à síncope e disfunção de VD.
  • Assintomáticos: O diagnóstico pode ser incidental em exames de rotina.

Estratificação de Risco Pré-Teste

Antes de partir para exames invasivos ou com radiação, usamos escores para definir a probabilidade clínica de TEP. Os mais usados são os escores de Wells e Geneva.

Escore de Geneva

Probabilidade (Simplificada):

  • TEP Improvável: 0-2 pontos
  • TEP Provável: > 3 pontos

Escore de Wells

Probabilidade (Simplificada):

  • TEP Improvável: 0-1 pontos
  • TEP Provável: >2 pontos

Métodos Diagnósticos

Dímero-D

  • É um produto da degradação da fibrina.
  • Seu principal valor está no alto valor preditivo negativo (VPN), ou seja, se negativo, é ótimo para excluir TEP em pacientes de baixa probabilidade.
  • Possui baixo valor preditivo positivo (VPP), pois se eleva em muitas outras condições (neoplasias, infecções, inflamações, internação).
  • Ajuste para Idade: Para pacientes acima de 50 anos, o valor de corte deve ser ajustado:  idade x 10 µg/L.

Angiotomografia de Tórax (Angio-TC)

  • É o método de escolha para o diagnóstico.
  • Apresenta alta sensibilidade (83%) e especificidade (96%).
  • Possui alto VPN em pacientes com risco baixo ou intermediário.
Fonte: Acervo de aulas do Grupo MedCof

Cintilografia Ventilação/Perfusão (V/Q)

  • É um método alternativo, que combina a análise da perfusão com a ventilação para aumentar a especificidade.
  • Indicações: Pacientes jovens, gestantes, alérgicos ao contraste iodado ou com insuficiência renal.
  • Limitação: Dificuldade para avaliar trombos periféricos.
Avaliação com combinação de perfusão com ventilação. Fonte: Acervo de aulas do Grupo MedCof.

Eletrocardiograma (ECG)

  • Casos leves: Taquicardia sinusal é o achado mais comum (até 40% dos casos).
  • Casos graves (Sinais de sobrecarga de VD):
    • Inversão de onda T nas derivações V1-V4.
    • Padrão QR em V1.
    • Bloqueio de ramo direito (completo ou incompleto).
    • O clássico padrão S1Q3T3.
Achados S1Q3T3. Fonte: Acervo de aulas do Grupo MedCof

Radiografia de Tórax

  • Geralmente é inespecífica, mas serve para excluir outras causas de dor torácica e dispneia.
  • Achados clássicos (pouco comuns):
    • Corcova de Hampton: Área em cunha sugestiva de infarto pulmonar.
    • Sinal de Westermark: Oligoemia (diminuição da trama vascular) em uma área do pulmão.
    • Sinal de Fleischner: Dilatação do tronco da artéria pulmonar.
Fonte: Acervo de aulas do grupo MedCof. 

Ecocardiograma Transtorácico (ECO-TT)

  • É útil principalmente para a estratificação de risco em pacientes já diagnosticados.
  • Pode mostrar dilatação das câmaras direitas, que ocorre em mais de 25% dos pacientes com TEP.
  • Avalia parâmetros como o diâmetro do VD, distensão da veia cava inferior e o TAPSE (contratura do VD).

Arteriografia Pulmonar

  • Antigamente considerada o padrão-ouro.
  • Hoje é raramente usada devido ao risco de mortalidade (0,5%) e complicações (1-5%).
Fonte: Acervo de aulas do Grupo MedCof.

Estratificação de Risco Pós-Diagnóstico (Mortalidade Precoce)

Após a confirmação do TEP, o próximo passo é avaliar o risco de mortalidade precoce (em 30 dias). Isso é feito com o escore PESI (Pulmonary Embolism Severity Index) ou sua versão simplificada, o s-PESI.

Parâmetros do Escore PESI e s-PESI

Classificação de Risco (s-PESI):

  • 0 pontos: Baixo risco (Mortalidade em 30 dias de 1,0%).
  • >1 ponto: Alto risco (Mortalidade em 30 dias de 10,9%).

Com base no PESI, exames de imagem (ECO/Angio-TC) e biomarcadores (Troponina/BNP), classificamos o TEP em níveis de risco para guiar o tratamento:

  • Alto Risco: Paciente com instabilidade hemodinâmica (PAS < 100 mmHg).
  • Risco Intermediário-Alto: Estável hemodinamicamente, mas com disfunção de VD (na imagem) E lesão miocárdica (Troponina/BNP elevados).
  • Risco Intermediário-Baixo: Estável hemodinamicamente, com disfunção de VD OU lesão miocárdica, mas não ambos.
  • Baixo Risco: Estável hemodinamicamente, s-PESI 0, sem disfunção de VD ou biomarcadores alterados.

Tratamento

O tratamento do TEP é baseado na estratificação de risco e inclui medidas de suporte, anticoagulação e, em casos graves, terapia de reperfusão.

Suporte Ventilatório e Circulatório

  • Suporte ventilatório: Suplementação de $O_2$ e ventilação mecânica, se necessário.
  • Suporte circulatório: Reposição volêmica (com cautela), vasopressores (Noradrenalina), inotrópicos (Dobutamina) e, em casos refratários, ECMO.

Anticoagulação Plena

É a base do tratamento para a maioria dos pacientes e deve ser mantida por 3-6 meses.

  • Início: Deve ser iniciado imediatamente em pacientes com probabilidade pré-teste intermediária ou alta, mesmo antes da confirmação diagnóstica.
  • Opções parenterais (iniciais): Heparina Não Fracionada (HNF), Heparina de Baixo Peso Molecular (HBPM, ex: Enoxaparina) ou Fondaparinux.
  • Antagonistas da Vitamina K (AVK – Cumarínicos):
    • Devem ser iniciados junto com a anticoagulação parenteral.
    • A terapia parenteral só deve ser suspensa após 5 dias E quando o INR estiver na faixa terapêutica por 48h, para evitar risco de eventos trombogênicos.
  • Novos Anticoagulantes Orais (NOACs/DOACs):
    • Atuam por inibição direta do Fator Xa (Apixabana, Rivaroxabana, Edoxabana) ou do Fator IIa/Trombina (Dabigatrana).

Características dos NOACs:

Terapia de Reperfusão

Indicada para pacientes de Alto Risco (com instabilidade hemodinâmica).

  • Janela de tratamento: Os melhores resultados ocorrem em até 48 horas do evento, mas a terapia pode ser útil em até 14 dias.
  • Drogas (Trombólise): Alteplase e Estreptoquinase. (Tenecteplase não é aprovada para TEP).
  • Risco: Não é recomendada para pacientes de risco intermediário-alto sem instabilidade, devido ao alto risco de sangramento do SNC.
  • Outras opções: Tratamento percutâneo (cateter) ou embolectomia cirúrgica.

Principais Contraindicações Absolutas à Trombólise:

  • Sangramento ativo (não menstrual).
  • Hemorragia intracraniana prévia.
  • Neoplasia maligna ou lesão vascular estrutural do SNC.
  • AVE isquêmico ou TCE há menos de 3 meses.
  • Suspeita de dissecção aguda de aorta.

Complicações e Seguimento

Sintomas Persistentes

A dispneia pode persistir por um período de 6 meses a 3 anos após o evento agudo. Fatores complicadores incluem idade avançada, comorbidades cardíacas/pulmonares, obesidade, tabagismo e sinais de disfunção de VD no diagnóstico.

Hipertensão Pulmonar Tromboembólica Crônica (HPTEC)

É a complicação tardia mais temida.

  • Incidência: Ocorre em 0,1% a 9,1% dos pacientes nos 2 anos após o episódio agudo.
  • Diagnóstico: É feito pela presença de trombo após 6 meses de anticoagulação plena (tempo mínimo obrigatório), avaliado por ECO-TT, Angio-TC, Cintilografia V/Q ou Arteriografia.
  • Fatores de Risco para HPTEC:
    • Relacionados ao TEP agudo: Episódios prévios de TEP/TVP, trombo extenso na Angio-TC, disfunção de VD ou sinais de HP no ECO-TT inicial.
    • Doenças crônicas: Shunts ventrículo-atriais, cateteres infectados, SAAF, hipotireoidismo, neoplasias e doença inflamatória intestinal.
  • Tratamento da HPTEC:
    • Cirúrgico (Preferencial): Tromboendarterectomia.
    • Percutâneo: Angioplastia pulmonar.
    • Farmacológico: Indicado para pacientes não cirúrgicos. Inclui anticoagulantes, diuréticos, Riociguate (estimulador da guanilato ciclase 

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