Entenda quais as Principais Alterações Colpocitológicas e condutas para a residência

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A interpretação da colpocitologia oncótica (Papanicolau) e a definição da conduta subsequente são habilidades essenciais na ginecologia. No mês de agosto deste ano, o Ministério da Saúde atualizou as diretrizes de rastreamento do câncer de colo de útero, o que nos leva a necessidade de discutir, também, seus sintomas e tratamentos.

Quais indicações da nova diretriz de rastramento?

Substituindo o conhecido exame Papanicolau, a Portaria Conjunta SAES/SECTICS nº 13 indica o rastreamento organizado com testes moleculares para detecção de DNA do HPV oncogênico como método prioritário. Depois de experimentos e pesquisas, esse método foi evidenciado com maior eficácia para o diagnosticar mais precocemente.

Vale ressaltar que sua implementação ainda está em processo de desenvolvimento no Brasil, mas a meta é que todo o território usufrua dela até o fim de 2026. Além disso,  o exame citopatológico Papanicolau passará a ser realizado apenas para confirmação de casos em que o teste DNA-HPV der positivo.

  • População-Alvo: Mulheres com idade entre 25 e 64 anos que já iniciaram atividade sexual (com penetração vaginal).
  • Periodicidade: Diferentemente do exame Papanicolau, os testes moleculares tem intervalo de rastreamento de 5 anos, após dois exames anuais consecutivos com resultados normais.

É importante dar atenção às populações especiais:

  • Gestantes: Seguem o mesmo rastreamento de não gestantes. Se a paciente for elegível, a coleta deve ser realizada na primeira consulta de pré-natal.
  • Histerectomizadas: Mulheres que passaram por histerectomia total (com remoção do colo) por motivos benignos são dispensadas do rastreamento. A exceção é para casos em que a cirurgia foi motivada por Neoplasia Intraepitelial Cervical (NIC) ou câncer de colo.
  • Imunossuprimidas: O rastreamento deve começar após o início da atividade sexual, com frequência semestral no primeiro ano e, depois, anual. Em pacientes com HIV e contagem de linfócitos CD4 abaixo de 200 células/mm³, o rastreamento semestral deve ser mantido.

Como Fazer a Coleta da Colpocitologia Oncótica (CCO)?

A coleta do material para o teste de DNA de HPV é muito semelhante à do Papanicolau:

  • Preparação: A paciente recebe as mesmas orientações do Papanicolau: não estar menstruada, não ter tido relações sexuais nas 48 horas anteriores, não usar cremes ou duchas vaginais.
  • Procedimento: A paciente se posiciona em uma maca ginecológica. O profissional de saúde (médico ou enfermeiro) insere um espéculo vaginal (“bico de pato”) para visualizar o colo do útero.
  • Coleta: Com uma pequena escova especial (semelhante a um cotonete alongado e com cerdas macias), o profissional faz uma rotação suave no colo do útero para coletar células da superfície e do canal cervical.
  • Armazenamento: Em vez de espalhar as células em uma lâmina de vidro (como no Papanicolau), a ponta da escova com o material coletado é colocada em um pequeno frasco com um líquido conservante. Esse meio líquido preserva o DNA das células e do vírus, se presente.

A grande vantagem desse método é que a mesma amostra líquida pode ser usada tanto para o teste de DNA de HPV quanto para o exame de Papanicolau, se necessário.

A Vacina Contra o HPV

A infecção persistente por tipos oncogênicos do HPV é um fator de risco necessário para o desenvolvimento do câncer cervical, estando relacionada a mais de 90% dos casos.

  • Vacina Quadrivalente (SUS): Cobre os sorotipos 6, 11, 16 e 18.
  • Público-Alvo:
    • População Geral: Meninas e meninos de 9 a 14 anos, em duas doses.
    • Imunossuprimidos e Pacientes com HIV+: Pessoas de 9 a 45 anos, em três doses.

Resultados Anormais e Condutas

Apesar de o novo método de rastreamento tratar diretamente do vírus, a análise citologia ainda é muito importante, já que a conduta varia significativamente conforme o achado e a idade da paciente. 

Resultado CitológicoConduta Imediata
ASC-US (Atipia de Células Escamosas, significado indeterminado)Repetir citologia
LSIL (Lesão Intraepitelial de Baixo Grau)Repetir citologia
ASC-H (Atipia de Células Escamosas, não afasta lesão de alto grau)Colposcopia
AGC (Atipia de Células Glandulares)Colposcopia
HSIL (Lesão Intraepitelial de Alto Grau)Colposcopia
AIS (Adenocarcinoma in situ)Colposcopia

Detalhando as Condutas

  • ASC-US:
    • Até 25 anos: Repetir citologia em 3 anos.
    • Entre 25 e 29 anos: Repetir em 12 meses.
    • ≥ 30 anos: Repetir em 6 meses.
    • Se a citologia de repetição vier alterada, a paciente deve ser encaminhada para colposcopia.
  • LSIL: Possui alto potencial de regressão.
    • < 25 anos: Repetir citologia em 3 anos.
    • ≥ 25 anos: Repetir em 6 meses.
    • A persistência ou piora do resultado na repetição indica colposcopia.
    • LSIL em gestantes: Não se realiza colposcopia. A conduta é repetir a citologia 90 dias após o parto.
Análise das citologias cérvico vaginal em um laboratório particular no município de Igatu-CE. Fonte: Morais J. A.; Carvalho L. A. et al. Disponível em: https://sis.unileao.edu. br/uploads/3/POSGRADUACAO/P__S201.pdf 
  • ASC-H e HSIL (“As Malvadas”):
    • A conduta é colposcopia com biópsia imediata para todas as pacientes.
    • Nesses casos, a estratégia de “ver e tratar” (realizar a exérese da lesão no mesmo ato da colposcopia) é aceitável.
Análise das citologias cérvico vaginal em um laboratório particular no município de Igatu-CE. Fonte: Morais J. A.; Carvalho L. A. et al. Disponível em: https://sis.unileao.edu. br/uploads/3/POSGRADUACAO/P__S201.p 
  • AGC e AIS:
    • Sempre indicar colposcopia.
    • É fundamental investigar o endométrio, especialmente em pacientes com mais de 35 anos ou com fatores de risco. A investigação pode ser feita com ultrassonografia transvaginal e citologia endocervical.

Colposcopia: O Olhar Ampliado

É o exame do colo do útero com um microscópio (colposcópio) após a aplicação de reagentes para realçar áreas suspeitas.

  • Objetivos: Selecionar o melhor local para a biópsia e, quando indicado, realizar o tratamento (ver e tratar).
A melhor área de biópsia é a junção escamocolunar (JEC). Basu P, Sankaranarayanan R (2017). Atlas de Colposcopia – Princípios e Prática: IARC CancerBase No. 13 [Internet]. Lyon, França: Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer. Disponível em: https://screening.iarc.fr/atlascolpo.php 
  • Passos do Exame:
    • Limpeza com Solução Salina: Para remover o muco e observar a vascularização inicial (vasos atípicos, pontilhados, mosaicos).
Padrão vascular em mosaico grosseiro. Basu P, Sankaranarayanan R (2017). Atlas de Colposcopia – Princípios e Prática: IARC CancerBase No. 13 [Internet]. Lyon, França: Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer. Disponível em: https://screening.iarc.fr/atlascolpo.php 
  • Aplicação de Ácido Acético (3-5%): Coagula as proteínas. Células com alta atividade de replicação (lesões) ficam com um aspecto branco (epitélio acetobranco).
Após a aplicação do ácido acético. Epitélio acetobranco denso. Basu P, Sankaranarayanan R (2017). Atlas de Colposcopia – Princípios e Prática: IARC CancerBase No. 13 [Internet]. Lyon, França: Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer. Disponível em: https://screening.iarc.fr/atlascolpo.php 
  • Teste de Schiller (Aplicação de Lugol): O iodo cora o glicogênio das células normais de marrom. Células displásicas, pobres em glicogênio, não se coram e ficam amareladas (iodo-negativas ou Schiller-positivo), indicando o local ideal para a biópsia.
  • Achados Anormais (Classificação):
    • Grau 1 (Menores): Compatíveis com ASC-US/LSIL. Incluem epitélio acetobranco tênue, borda irregular e mosaico ou pontilhado fino.
    • Grau 2 (Maiores): Sugerem lesões de alto grau. Incluem epitélio acetobranco denso, mosaico grosseiro e atipia vascular.
  • Junção Escamocolunar (JEC): A visualização completa da JEC é crucial. Se a JEC não é totalmente visível (localizada dentro do canal), a colposcopia é considerada insatisfatória.

Tratamentos Excisionais: Quando e Como?

A Exérese da Zona de Transformação (EZT), também chamada de Cirurgia de Alta Frequência (CAF) ou LEEP, é o tratamento de escolha para muitas lesões.

  • “Ver e Tratar”: Realizar a EZT na primeira consulta colposcópica. Critérios incluem: citologia de alto grau (HSIL, ASC-H), achados colposcópicos maiores, JEC visível, ausência de suspeita de invasão e paciente com mais de 25 anos.
  • Conização: É uma excisão em formato de cone, geralmente feita com bisturi de lâmina fria em centro cirúrgico. É preferível para avaliar as margens e é indicada quando a colposcopia é insatisfatória (EZT tipo 3).

Quais as principais condutas pós-biópsia (Anatomopatológico)?

  • NIC I: É considerada uma infecção transitória pelo HPV com alta taxa de regressão. A conduta é repetir a citologia e a colposcopia em 6 meses.
  • NIC II e III: São lesões de alto grau. A conduta após uma biópsia que confirma NIC II/III é indicar a EZT. O seguimento posterior depende do resultado da peça cirúrgica:
    • Margens Livres: O seguimento é feito com citologia em 6-12 meses.
    • Margens Comprometidas por NIC II/III: A paciente deve realizar seguimento com citologia e colposcopia a cada 6 meses por 2 anos. Se a prole da paciente estiver completa, a histerectomia pode ser uma opção.

Terapia Medicamentosa 

No mês do Outubro Rosa, o Ministério da Saúde recebeu o primeiro lote do Trastuzumabe Entansina, um medicamento inovador que será incorporado ao tratamento de câncer de mama HER2-positivo no Sistema Único de Saúde (SUS).

  • Medicamento: Trata-se do Trastuzumabe Entansina, indicado para mulheres com câncer de mama HER2-positivo em estágio III que ainda apresentam sinais da doença após o tratamento quimioterápico inicial. Segundo o diretor do Departamento de Atenção ao Câncer, o medicamento pode reduzir a mortalidade em até 50% para este grupo de pacientes.

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